Andando por aí: Tempos de violência - Correio da Lavoura

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20 de abr. de 2018

Andando por aí: Tempos de violência

 Por João da Rua



1. Não se assustem mais com o noticiário. O drama de hoje pode ser a tragédia de amanhã. As chacinas se sucedem, execuções idem, no aperto do gatilho de um aparelho policial que é considerado um dos mais violentos do planeta. E neste caso, é bom considerar que o braço armado das classes dominantes inscreve-se entre aqueles que mais matam no mundo.
A este respeito, lembro-me agora de um contundente artigo no Jornal do Brasil, de autoria de nosso saudoso Betinho – sim, aquele mesmo, o citado irmão do Henfil nos versos de Aldir Blanc e que Elis Regina imortalizou em “O bêbado e o equilibrista”. Betinho, há cerca de 30 anos, deixou cravada sua sentença no título do seu libelo contra a violência policial: PM – Para Matar.

2. Essa história é antiga. O imperial capitão-do-mato, caçador de escravo fugido, agente armado da Casa Grande, agia decisivamente contra a senzala, estendia o braço do feitor em punição, tingindo de vermelho-sangue as terras plantadas pelo trabalho servil. Este enredo perdura até hoje, exacerbado por uma violência que ao longo do tempo só se fez modernizar (tecnicamente), justificando-se ideologicamente muitas vezes pelos meios de comunicação.

3. Falar sobre a violência que nos ronda dia e noite é o mesmo que proclamar a vitória da morte sobre a vida. Para o brasileiro comum, homem do povo (se é que isso ainda existe), a impressão que fica é a de que os bandidos eliminaram todos os mocinhos da nossa grande aldeia.
Olhando ao redor, a impressão que temos é que ninguém ainda se deu conta, pra valer, de que essa cultura do extermínio, do ódio pelos de baixo (aquele velho dito, “pobre tem mesmo é que morrer”, parece ter voltado à tona, conscientemente ou não). Esse sentimento pode nos levar, a partir de tanto homicídio, ao suicídio político e social. Esta constatação, óbvia para quem tiver a coragem de desvendar nossa trágica realidade, é que levou um grande brasileiro infelizmente desconhecido da grande maioria, nacionalista exaltado, a temer pelo nosso futuro como nação. Falo de um notável baiano, Bautista Vidal, que já nos deixou. Como engenheiro, conhecedor profundo das nossas potencialidades energéticas, Vidal não se cansava de alertar: “Somos, por isso mesmo, o país mais cobiçado do mundo pelo grande capital multinacional”.

4. A solução para a tragédia brasileira, contrariando a maioria dos poucos amigos que me restaram, é invariavelmente radical: se quisermos que a nossa bandeira continue tremulando no mastro do nosso futuro como nação, isto só acontecerá no dia em que a senzala tomar de assalto a casa grande, providenciando em seguida sua demolição. Enquanto ela existir, como foi arquitetada e construída, só restará à maioria do povo brasileiro permanecer como hoje se encontra, ou seja, a que reproduz a mesma situação daquele inquilino que paga um aluguel altíssimo para morar numa casa que lhe pertence.