Por Jean Aquino
Vamos deixar a política de lado. Se é que é possível. Falemos da sedução das palavras. É permitido e constitucional estar encarcerado e trabalhar. Alheios a posições de esquerda ou direita, admitamos que Lula já teria emprego garantido se assim o quisesse e em função em que demonstra notada competência: ensinar como falar por duas horas de forma articulada, loquaz (sem ser verborrágico) e clara.
Segue aqui um adendo sutilmente viperino: sem o expediente risível de usar cola na mão e nem precisar ler (?) em nenhuma tela de teleprompter.
O que lhe falta em gramática, sobra em articulação. Quando a norma se ausenta, surge a frase de impacto. Perdem-se alguns plurais, mas ganham-se raciocínios rápidos e de perceptível lucidez.
Verdades? Mentiras? Não se pretende aqui emitir pareceres técnicos sobre suas alegações ou sobre as razões de seu encarceramento. Este é um texto que fala da sedução das palavras. Da admiração pelo discurso e não necessariamente pelo orador. Do encanto que a frase fluida e a expressão vívida sempre tiveram e sempre terão para aqueles que admiram o poder da oratória.
As palavras lhe jorram sem o gaguejar daqueles a quem faltam vocábulos e raciocínio. As conexões se evidenciam de forma admirável e as relações de causa e efeito são estabelecidas ainda que aqui e ali não se empregue a conjunção correta. Mesmo seu mais contumaz inimigo admite, resignado, que, se lhe dão a palavra, muitas convicções se estremecem.
Enquanto isso, a mim só ocorre imaginar um babuíno, que só constrói sofríveis frases quando está limitado a 140 caracteres, corroendo-se em um misto de admiração silenciosa e inveja corrosiva.
*Jean Aquino é professor de Língua Portuguesa.