Oswaldo Cruz e a saúde pública
“Em 26 de março de 1903, Oswaldo Cruz assumiu o cargo de diretor-geral da Saúde Pública, com a difícil tarefa, entre outras, de erradicar a febre amarela do Rio de Janeiro. Seguindo o exemplo da Comissão Americana que saneou Cuba, levou ele a efeito uma campanha antiamarílica com resultados extraordinários, a ponto de poder afirmar, em 1907, que essa doença não mais existia de modo epidêmico no Rio de Janeiro. A par do combate à febre amarela, extinguiu a epidemia de peste bubônica e de varíola, além de proceder a uma profunda reforma no Código Sanitário, remodelando, ao mesmo tempo, todos os órgãos de saúde, com grande benefício para a higiene e economia do país”.
Do longo verbete biográfico de Oswaldo Cruz na Enciclopédia Barsa (edição de 1963) extrai o que considerei necessário para ilustrar a grande importância do trabalho desenvolvido pelo notável sanitarista há mais de um século. Nada melhor para fazer a turma de hoje – especialmente a comunidade médica – entender como se levava a sério a Medicina no Brasil, encarada então, como deve ser, cientificamente. E no caso do Dr. Cruz, especificamente a questão sanitária, levada absolutamente a sério por quem acumulava em seu currículo de contínuo pesquisador uma larga experiência como bacteriologista.
O mosquito de nossas vidas, que nos pica na temporada úmida do verão, sua estação preferencial de contágio, está nos azucrinando há cerca de 30 anos. O aedes aegypti, vetor também da febre amarela que o Dr. Cruz erradicou no princípio do século passado, possivelmente numa das maiores campanhas sanitaristas registradas na história do Brasil, desafia, ano após ano, os nossos dirigentes da área de Saúde – este grande negócio que enriquece doutores incompetentes e clínicas/matadouros que se multiplicam pelo país inteiro. Isto para não falarmos desse grande golpe que o neoliberalismo, a partir de Collor, aplicou no povo brasileiro: a disseminação dos planos de saúde. Hoje sabemos que 70% desses planos, se tivéssemos governantes voltados para a defesa intransigente dos interesses da nossa população, seriam sumariamente descredenciados. Mas isso é uma longa história que se justifica, para os inimigos do Brasil, com o sucateamento da saúde pública. Não há setor hoje, no vasto campo da administração pública, mais degradado que a Saúde. Olhem ao redor e fiquem atentos ao noticiário das TVs.
Matéria veiculada esta semana pelo jornal O Globo (quarta-feira, dia 20), com chamada na primeira página, nos informa: “Os casos suspeitos de dengue no Estado do Rio de Janeiro dispararam em uma semana. De acordo com boletim epidemiológico da Secretaria de Saúde, o total passou de 661 para 2002, um aumento de 202%. Na capital, já foram 283 casos”.
Redivivo em sonho e no absoluto controle de suas atribuições de então, na gestão revolucionária que lhe propiciou o presidente Rodrigues Alves na capital da República, para o Dr. Cruz esses índices de agora seriam impensáveis, ainda que se relativize a grande diferença do número de habitantes.
Afinal, que médicos – desses que se proliferam por aí como herdeiros graneiros e presunçosos da condenada (há mais de 30 anos) “máfia de branco”, conhecem em significado e extensão a obra que ultrapassou fronteiras deste grande brasileiro que foi Oswaldo Cruz, sua responsabilidade científica e, acima de tudo, sua sensibilidade social?