Vicente Loureiro
Faz quase meio século que a Região Metropolitana do Rio de Janeiro foi oficialmente reconhecida. E teve então institucionalizada uma primeira tentativa de se estabelecer uma governança sobre os assuntos de interesse comum dos municípios que a compunham e do estado federado que a continha, acabado de ser instaurado, fruto da fusão do Estado da Guanabara com o antigo Estado do Rio. Tempo longo, porém, insuficiente, para que, de fato e de direito, o desafio metropolitano fluminense fizesse jus a uma gestão compartilhada e colaborativa entre seus entes. Difícil explicar o porquê.
Serve de consolo talvez, saber que não foi só aqui. Outras metrópoles brasileiras, apesar de terem tido trajetórias mais contínuas e animadas que a do Rio, também não foram, nem são, exemplos de exitosas políticas de desenvolvimento regional integradas e inclusivas implementadas. Meritórios esforços de reconhecimento e dimensionamento dos problemas de envergadura mais do que local foram desencadeadas em várias delas. Havendo iniciativas inovadoras, mas quase sempre de caráter setorial e de pouco impacto sistêmico no território. De um modo geral, foram frutos de soluções impostas, sem prévio e amplo debate entre os entes e, deles, com a sociedade. Prova da ausência de visão de futuro conjunta e de prática efetiva de gestão na escala metropolitana. Ações espasmódicas de baixo impacto socioambiental.
Mas algo parece animar o futuro imediato das regiões metropolitanas brasileiras, em especial a do Rio de Janeiro. Tanto tempo decorrido deve estar ajudando a sedimentar o conceito de que o interesse comum em uma metrópole, é muito mais do que a soma dos interesses locais nela presentes. Isso exige uma divisão de responsabilidades entre os municípios e o estado, compartilhando o poder decisório e a titularidade dos serviços públicos de abrangência mais do que local, através de uma fórmula justa e colegiada de gestão das políticas promotoras de maior coesão socioterritorial para um desenvolvimento regional sustentável e sem deixar ninguém para trás.
No caso da metrópole fluminense, a boa notícia vem do Acórdão dos integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado, exarado no último dia 31 de maio deste ano, quando julgaram a representação de inconstitucionalidade impetrada pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, movida ainda na gestão do ex-prefeito Crivella, contra a Lei Complementar nº 184, de 27 de dezembro de 2018, que dispõe sobre a Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Fazendo pequenas correções e ajustes que julgaram procedentes, os desembargadores puseram um ponto final nos questionamentos, reforçando, assim, a importância, contemporaneidade e o alcance da referida lei complementar, dando respaldo para que seus princípios e postulados sejam respeitados e a governança sobre os assuntos de interesse comum na região possam ser tratados como merecem e como a população metropolitana tanto espera.
A partir de agora, a Região Metropolitana do Rio tem, de fato e de direito, condição de ser dirigida a contento. Tem modelo de gestão compartilhada consagrado legalmente, com a participação dos entes assegurada e proporcional a importância socioeconômica de cada um. Não há concentração de poder decisório em nenhum deles e as deliberações sobre os assuntos comuns se darão segundo resoluções de seu órgão máximo, o Conselho Deliberativo, composto pelo governador do Estado, pelos prefeitos da região e por representantes da sociedade civil. Continuará sendo difícil dividir o poder político por aqui. Mas, o recente exemplo da concessão dos serviços de saneamento em lotes regionais é sinal de que novas possibilidades estão a caminho. Quem sabe, não chegou finalmente a hora de se poder governar a metrópole. Afinal, estamos tentando faz meio século.
*Vicente Loureiro é arquiteto e urbanista.