Vicente Loureiro
Na verdade, não é um fenômeno novo. Faz meio século que ele ocorre de forma muito acentuada e seguindo modelo de exclusão social, pois, na prática, empurra para cada vez mais longe os assentamentos desprovidos de infraestrutura e serviços e com moradias precárias. Um procedimento de urbanização expansionista e desordenado, destinado a acolher a pobreza sem conhecer limites ou controle. Produzindo segregação socioespacial e alimentando atitudes de gentrificação. Pior, construindo o “paraÃso na terra” para a informalidade e seus agentes de governança: o crime organizado.
Impressiona o fato do custo e dos passivos gerados por este modelo insustentável de alargamento das cidades não ser ainda considerado como a questão urbana central a ser enfrentada. A informalidade é cara e ineficaz. Produz moradias de má qualidade com insuficiências diversas. Muitas das vezes com localização inadequada e em áreas de risco ambiental, cujos custos invisÃveis de soluções alternativas encontradas para obtenção de serviços e infraestrutura não costumam ser computados. É uma disfuncionalidade do mercado. Produto de um hiato entre o modo formal e informal de produzir e assentar moradias populares. Resultante também da falta de programas habitacionais suficientes e duradouros.
Carta da periferia metropolitana do Rio de Janeiro (Austin-Nova Iguaçu). Exemplo de expansão urbana precarizada. Crédito: Ilustração |
Pratica-se um “laissez faire” urbanÃstico e habitacional. Cada um por si e, sabe-se lá, quem por todos. Vista grossa e pragmatismo polÃtico tentam não ver os impactos negativos do processo. Adiando assim a busca de soluções e o enfrentamento de práticas ruinosas a uma forma de desenvolvimento urbano mais inclusivo. É preciso agir. Tornou-se imperioso impor limites a expansão territorial sem controle. Para tanto, deve-se onerar a outorga do uso e ocupação do solo que a legislação urbanÃstica e edilÃcia das cidades costuma estabelecer gratuitamente. É possÃvel e justo cobrar pela conversão do solo rural em urbano. Chega a ser imoral não taxar a valorização concedida, graças ao incremento do potencial construtivo e das condições de edificar determinada pelos Planos Diretores. Devemos evoluir para considerar como renúncia fiscal dos municÃpios a não utilização desses mecanismos consagrados no Estatuto da Cidade, mas ainda de baixÃssima aplicabilidade. Para além das restrições de uma economia claudicante, é dever subtrair da cidade que pode pagar recursos para oferecer aos que não podem. Melhor e mais barato é prevenir do que continuar tentando remediar.
*Vicente Loureiro é arquiteto e urbanista.