Por Leandro Miranda
Meu Deus, mas que bandeira é esta
Que impudente na gávea tripudia?!
Silêncio, Musa! Chora, chora tanto
Que o pavilhão se lave no seu pranto
Tu, que da liberdade após a guerra,
Foste hasteada dos heróis na lança,
Antes te houvessem roto na batalha
Que servires a um povo de mortalha!”.
(Trecho do Texto Navio Negreiro de Castro Alves)
Enquanto no Brasil a política “inteligente” de amputações orçamentárias para pesquisas, educação e saúde seguem como “árvaro” das arminhas dos projetos de governo, que não quer enxergar os prejuízos que causam à nação quando não se voltam para os cortes de seus privilégios e sanguinários fundos eleitorais, os brasileiros vão perdendo não só grandes estudiosos, cientistas, pesquisadores, etc., mas também acervos importantíssimos para outros países mais conscientes, ou menos burros, de seus deveres para com o desenvolvimento em suas gestões públicas de Estado e não de descartáveis governos propagandistas temporários.
Após receber o acervo completo do importante arquiteto brasileiro Paulo Mendes da Rocha, a Casa da Arquitetura - Centro Português de Arquitetura, situado em Portugal, acaba de receber todo o acervo do arquiteto e urbanistas Lúcio Costa, um dos mais importantes representantes do movimento modernista do Brasil que, ao lado de Oscar Niemeyer, projetou a Capital Federal do país, Brasília. Como também criou todo o projeto urbanístico da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, dentre outros tão importantes projetos brasileiros, quiçá até internacionais, também em parcerias com outros grandes pensadores do modernismo no país. Além de ter sido um grande estudioso e pesquisador da história da formação arquitetônica e artística brasileira, desde os tempos coloniais.
O arquivo doado pela família para o museu de Portugal, abrange cerca de 11.000 documentos dos mais diversos produzidos entre os anos de 1910 e 1998, como correspondências, artigos impressos em jornais e revistas, cartazes, fotos, álbuns de família, cartões postais, mapas, desenhos de plantas, rascunhos, apontamentos dos mais diversos feitos em envelopes, versos de folhinhas de calendários, folhas de rascunhos e até em cartões de visitas. Todo esse material é relativo à carreira de Lúcio Costa como profissional liberal e como diretor da Divisão de Estudos e Tombamentos do Serviço Nacional de Patrimônio Histórico e Artístico (SPHAN), que se tornaria o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
(Fonte
da imagem: chiquinhodornas.blogspot.com) |
A saída desse material do Brasil como doação feita pela própria família de Lúcio Costa, parece indicar que mesmo a elite financeira e intelectual do país não confia nas instituições brasileiras de preservação patrimonial, que foram pensadas por esses mesmos grandes intelectuais, mas não por conta de suas competências que muitas vezes são sustentadas por funcionários que trabalham mais por ideologias de carreira. Mas por conta da falta de investimentos, repasse de verbas, interesses e sucessivas amputações do Estado do Brasil para as pesquisas nas mais diversas áreas científicas e tecnológicas, preservação patrimonial, educacional, cultural, ambiental, medicinal, biológica e até para combate à incêndios em instituições museológicas e hospitais (retratos recentes confirmam esse parecer).
A recente amputação do Ministério da Economia para as pesquisas no Brasil, por exemplo, parece não só assinar em baixo o dar de graça à países desenvolvidos grandes pesquisadores, estudantes e cientistas, mas também causam incertezas que parecem tirar de nós até acervos importantíssimos que diz respeito à nossa formação identitária. Tendo como consequência cada vez maior a perda de nossa identidade intelectual e cultural brasileira e faz com que sejamos obrigados cada vez mais a engolir uma falsa e barata cultura plastificada, descartável, de aparências “espelhadas e brilhantes”, que deixa estampada em nós uma coisa mascarada, sem fundamentos, sem raiz e sem profundidade (como os portugueses colonizadores que “nos iludiam’ com espelhos e quinquilharias em troca de grandes riquezas). E assim, o que somos, vai dessa forma migrando para outros países que passam a ter neles, ou com eles, o melhor de nossa brasilidade cultural e intelectual, enquanto por aqui as descartáveis “máquinas caça-níqueis” vão criando a contravenção social baseado num desespero emergente. Nos levando cada vez mais a deixar de ser quem somos, para ser cada vez mais aquilo que os outros querem que sejamos. Tem um pensamento muito inteligente budista (sem querer pregar religião) que diz: “Se esquecermos quem somos, o outro nos fará ser qualquer coisa!”
Parabéns, Brasil! Pelo Centenário da Semana de Arte Moderna que será comemorado ano que vem por Portugal, então cantemos (de raiva) aquela famosa música dos anos 70 cantada por Roberto Leal: “Ai bate o pé, bate o pé, bate o pé. Ai bate o pé faça assim como eu...”.