TARIFA E SUBSÍDIO NÃO BASTAM - Correio da Lavoura

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25 de nov. de 2021

TARIFA E SUBSÍDIO NÃO BASTAM

Vicente Loureiro


Vivemos uma situação no financiamento dos transportes públicos, principalmente nos de alta capacidade, de esgotamento do modelo da tarifa como sendo fonte principal e, por vezes, a única para o custeio das despesas fixas e variáveis praticadas no curso das operações. Em síntese, as tarifas não remuneram os custos dos serviços e parte da população já não consegue mais pagar por elas. E o pior, os que ainda podem pagar já estão optando por aplicativos do tipo Uber em caso de trajetos curtos.

Esperar exclusivamente do poder público, via subsídios crescentes, a solução para tal impasse é ilusório, além de insustentável. Pode haver casos de exceção, mas longe estão de ser a regra e muito menos benchmarking a ser seguido. A crise econômica, agravada pela pandemia, põe freio e limite nessas possibilidades paternalistas. Além de trazerem complicadores novos a questão como as mudanças de hábitos aceleradas na quarentena, através do crescimento expressivo do e-commerce e do trabalho remoto. Olhando para frente, não se deve desconsiderar um cenário de tarifas ainda mais altas, turbinadas pela inflação, com demandas decrescentes por conta do desemprego e empobrecimento da população. Exigindo mais subsídios do poder público que não tem mais como sustentá-los. O que fazer?


Apenas a título de estimular o debate, socorro-me de teses defendidas por especialistas, faz algum tempo, em congressos e artigos técnicos. Uma delas, propõe tratar a infraestrutura de transporte de massa como equipamento urbano a serviço de toda a cidade. Financiada por todos, inclusive pelos que não a utilizam. Substituindo a tarifa por uma taxa de transporte universalizada. As perdas causadas pela pandemia nos sistemas de transportes impõem a retomada mais objetiva e urgente dessa discussão.

Outra tese que merece também ser levada em conta é a que trata da obtenção de receitas acessórias e adicionais, colaborando para o equilíbrio dos contratos de concessão dos serviços de transportes. Por aqui, acostumou-se a considerá-las residuais e difíceis de serem apuradas. No entanto, há exemplos mundo afora onde elas representam parte significativa na sustentação e aperfeiçoamento dos serviços. Falo de uma mudança de atitude, tanto das concessionárias quanto do poder público, em relação à captação de tais recursos. É imprescindível que os contratos ultrapassem os muros e limites da concessão e que dialoguem com as cidades a que servem. Reconhecendo a atratividade exercida, por exemplo, por algumas estações para atividades comerciais e de serviços, o que poderiam ser a elas incorporadas, oferecendo mais conforto aos passageiros e tirando partido do movimento de travessia de pedestres tão comuns nesses pontos nevrálgicos e dinâmicos das cidades. 

Outra hipótese, é a recomendada pela metodologia DOT (Desenvolvimento Orientado pelo Transporte), que deveria também ser considerada e sua implantação coordenadas pelas concessionárias e pelo poder concedente em articulação com os municípios, empresas de transportes e empreendedores imobiliários locais, entre outros. Esperar que partam deles esforços no sentido de promover integração operacional, física e tarifária ao redor das estações ferroviárias ou metroviárias é o mesmo que esperar que “o rabo abane o cachorro”. Cabe aos sistemas de transportes, estruturantes do desenvolvimento urbano, e aos responsáveis pela implementação de políticas públicas de dimensão mais do que local, a responsabilidade de provocar tais inovações. Acreditar na eficácia do binômio: tarifa + subsídio como solução única para a equação de sustentabilidade de sistemas tão custosos quanto indispensáveis as cidades é apostar na perda cumulativa de sua eficiência e de seu poder como indutor de um processo de desenvolvimento mais harmônico e inclusivo.

*Vicente Loureiro é arquiteto e urbanista.