ATRATIVOS URBANOS - Correio da Lavoura

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29 de mar. de 2022

ATRATIVOS URBANOS

Vicente Loureiro


Em cidades como as nossas, onde passivos urbanísticos e sociais ainda são muito elevados, é natural que se fale mais deles do que de seus ativos. Sendo territórios ainda tão desiguais na oferta de bens e serviços faz-se necessário distinguirmos experiências exitosas na alavancagem daquilo que pode ser transformador de realidade tão vexatória, quanto, por vezes, desanimadora. Falo do papel do urbanismo e da arquitetura na concretização de mudanças potentes no modo de fazer a vida melhorar, seja pontualmente através de um edifício num pedaço qualquer da cidade, seja através das orientações do seu plano diretor, reconfigurando parte significativas e estruturantes do seu ambiente urbano.

Merece atenção as alterações importantes provocadas pelo Plano Diretor Estratégico da cidade de São Paulo (PDE), aprovado em 2014 e apresentadas de forma sintética na edição nº 48/49 da revista Monolito, com ênfase nos impactos positivos por ele gerados, sobretudo nos empreendimentos direcionados à classe média e média alta. Embora com dificuldades de fazer os benefícios pretendidos chegar aos segmentos de renda mais baixas da população. Dificuldades, a meu ver, muito mais provocadas por razões econômicas do que urbanísticas, apesar da necessidade de ajustes na legislação, sobretudo os instrumentos de redução dos custos da terra e de promoção de acesso a ela.


O mercado imobiliário em São Paulo anda bombando. Até aí nada de novo no front. O diferencial é que, no último biênio, ele vem batendo o recorde de mais de 50 mil unidades habitacionais produzidas ao ano. Parte significativa desse incremento, segundo a revista, deve-se ao Plano Diretor Estratégico, graças aos incentivos de aumento do potencial construtivo em áreas no entorno de corredores e estações de transporte público e aos empreendimentos com fachada ativa e com variado cardápio de usos e dimensões das unidades ofertadas, entre outras novidades.

Os agentes promotores da construção civil entenderam o recado do plano e responderam rápido, promovendo importantes inovações. Uma delas é o da valorização do urbano retratada numa relação mais amigável dos empreendimentos com o seu entorno, sem gradis ou muros e, por vezes, até permitindo a livre e desimpedida travessia de pedestres no pavimento térreo. Outra novidade é o retorno da arquitetura de boa qualidade, restabelecendo o protagonismo de arquitetos de vanguarda na elaboração de projetos com soluções ousadas, mas viáveis. Além de uma adesão radical ao uso misto, com iniciativas capazes de abrigar no mesmo edifício atividades comerciais, de escritórios, hotéis e residenciais. Sem dúvida um avanço.


Os empreendedores mais antenados e capazes de perceber que os desejos dos consumidores costumam mudar de acordo com as circunstâncias, já conseguem compreender que a homogeneidade de usos e de renda no mesmo bairro, por exemplo, acabam por engessá-lo. Por isso, apostam tanto na diversidade dos usos quanto nos tipos de apartamentos. Claro, tudo próximo do sistema de transportes, antevendo inclusive a obsolescência das vagas de automóveis existentes ou previstas. E o mais importante é que estão, cada vez mais, a “vender” à vista panorâmica da cidade e as comodidades que uma cena urbana dinâmica e variada pode oferecer. São os atrativos urbanos em voga. Que a moda se espalhe e chegue as habitações populares.

*Vicente Loureiro é arquiteto e urbanista.